Falar sobre o Omi Eró e sobre o Agbo é muito complexo, no entanto, dentro do que posso falar publicamente, vou procurar tirar um pouco das dúvidas existentes entre o Povo do Asè.
Primeiramente, antes de falar sobre Omi Eró e sobre o Agbo, temos que falar sobre a importância das folhas dentro do Candomblé, sobre suas funções, sexo, o elemento da natureza a qual pertence.
As folhas estão sob o domínio do Òrìsà Osanyin, aquele que Olodunmare determinou que seria o grande Onisegun (médico) da humanidade. Abaixo, transcrevo um mito, que ilustra como Osanyin, se tornou o Dono das Folhas
Ifá foi consultado para Òsanyìn no dia em que Olódùmarè cobriu uma cabaça e convidou a Òrúnmìlà ir descobri-la e através da consulta ao oráculo, adivinhar o que havia dentro dela. Òsanyìn insistiu em acompanhar Òrúnmìlà, mesmo sendo aconselhado a ficar porque ele estava em dificuldade. Òsanyìn, porém, foi inflexível. Antes que eles chegassem lá, Olódùmarè tocou o sangue de sua esposa com um tecido branco de algodão, guardou em uma cabaça sobre a esteira na qual Òrúnmìlà sentaria ao consultar Ifá. Òrúnmìlà consultou Ifá e disse exatamente o que havia dentro da cabaça branca. Olódùmarè o louvou, aclamando seu poder. Òrúnmìlà, então, pediu que Olódùmarè sacrificasse um cão e uma cabra. Olódùmarè concordou com o sacrifício. Òsanyìn, emocionadamente se juntou a Òrúnmìlà na procura dos materiais para o sacrifício. Enquanto estava se esforçando para ajudar a matar o cachorro, a faca que ele estava segurando escapou de sua mão e caiu sobre a sua perna, fazendo uma ferida muito grande. Òrúnmìlà pediu que levassem Òsanyìn para a casa de Òrúnmìlà. Òrúnmìlà o curou, mas Òsanyìn não poderia usar novamente a perna para trabalhos árduos. Òrúnmìlà teve pena dele e deu-lhe vinte folhas de Ifá para cada tipo de enfermidade, para proporcionar-lhe uma fonte de renda. Foi assim que Òsanyìn se tornou um herbolário e, posteriormente, aprofundando-se na farmacopéia.
As folhas tem a função de purificar, a folha é o primeiro elemento a ser consagrado para a preparação das obrigações dos Òrìsàs. A folha é o primeiro Ejé (sangue) a ser utilizado, dito Sangue Vegetal, sangue esse insubstituível na nossa religião. Utilizamos as folhas desde quando nascemos, até o nosso momento derradeiro. Há um provérbio que diz: Kosi Ewe, Kosi Orisa, ou seja: Sem folha não há Òrìsà.
Existem folhas do sexo masculino e feminino, temos as folhas parasitas (Afomo), que são àquelas que dependem de outras para sobreviver, há ainda, folhas que são de ambos os sexos, feminina e masculina, temos as folhas das águas, como o Oju Oro e Osibata.
Temos as folhas calmas (Eró), que tem a função de tranquilizar, amenizar o estado em determinadas situações. Há as folhas quentes (Gun), que tem a função de esquentar, agilizar.
Na natureza as folhas vivem dentro do contexto dos quatros elementos, que também são as representações dos Òrìsàs: Água, Fogo, Ar e Terra.
A coleta das folhas para se preparar o Omi Eró e o Agbo, deve ocorrer à alvorada (há exceções, nas quais as folhas devem ser colhidas à tarde ou ainda ao anoitecer -, mas não para o Omi Eró ou Agbo), o Sacerdote deverá estar de "corpo limpo", ou seja, privados de relações sexuais e em jejum.
O Sacerdote deverá solicitar autorização à Òsanyìn, a fim de que sua trajetória transcorra sem imprevistos (a mata é um espaço de grande perigo e deve ser muito respeitada e temida).
Òsanyìn é consultado através do jogo do Obì (Cola Acuminata) ou Orógbó (Garcinia Cola). Além disso, devemos "pagar" à Òsanyìn pelas folhas que estamos retirando da sua "casa", esse pagamento é feito por meio de oferendas como: mel, vinho, fumo de corda, obì, ataare e orógbó. É importante destacarmos, que para fazermos oferendas na mata, não há a necessidade alguma de deixarmos velas, garrafas, alguidares, sacolas ou outros materiais que não sejam orgânicos
Isso é uma grande ofensa à divindade da mata, que pode ser considerada, numa visão moderna, como o "padroeiro" da ecologia. Devemos ter cuidado ao coletar as folhas, atentando-nos se no local existem outros exemplares daquela espécie, tomando o cuidado para não arrancar os brotos das folhas (preservando-a dessa forma), deixando as sementes no local, de modo que novas plantas nasçam etc.
As folhas possuem um poder benéfico e maléfico. O uso indevido jamais deve ocorrer, por isso é necessária muita experiência na sua manipulação. Òsanyìn é um Òrìsà muito poderoso e suas folhas e encantamentos devem ser usados com muito cuidado.
Hoje, infelizmente com o grande desmatamento e, sendo que muitas casas de asè estão presentes nas grandes metrópoles, os Ilés costumam fazer um pomar dentro de casa com as folhas do Òrìsà (uma espécie de Igbo kekere – uma pequena floresta). Desta forma, as oferendas à Osanyin, são realizadas dentro da própria casa de Candomblé.
Assim sendo, seja na mata, seja no igbo da Casa de Asè, o Sacerdote deverá colher as folhas para o Omi Eró, abaixo, listo as 8 principais folhas:
Etipon-Ola: Pega-Pinto; Bredo de Santo Antônio;
Gboroayaba: Salsa da Praia;
Tete: Bredo sem Espinho
Teteregun: Cana de Macaco
Rinrin: Oriri, Folha de Vidro
Efinrin: Manjericão Miúdo
Odundun: Folha da Costa
Werenjeje: Juquiritiba
Essas folhas são louvadas, quinadas, sendo desta forma, transformadas no primeiro Ejé, o Ejé vegetal. Esse sangue verde é utilizado para a consagração dos objetos dos Òrìsàs e para purificar as pessoas.
Há, também, o Omi Eró de cada Òrìsà, no qual são acrescentadas mais 8 folhas pertencentes aquele Òrìsà, exemplifico com Oya.
Afere: Crideuva
Ewe Mesan: Pára-Raio
Apeje: Sensitiva
Agbola: Mata Pasto
Eso Feleje: Trombeta
Olobotunje Funfun: Pinhão Branco
Koleorogba: Sete Chagas
Assim, sucessivamente para cada Òrìsà.
Durante um período de 3 dias, está infusão de folhas tem a função de Omi Eró (água que acalma), depois são acrescentados outros elementos como: Waji, Efun, Obi, Orogbo, Ataare, Lelekun, Bejerekun, Aridan e o Ejé do reino animal, passando então a ser chamado de Agbo.
Todo o Omo Òrìsà, quando iniciado tem seu pote de agbo, pertencente ao seu Òrìsà e, durante a sua iniciação é utilizado em seus rituais.
Para toda esta preparação existe um ritual litúrgico, com rezas, cânticos, evocações do poder do Òrìsà Osanyin, o Deus das Folhas. As folhas sem a sua encantação não tem o mesmo poder, por isso, o Sacerdote que prepara o Omi Eró e o Agbo, deve saber como evocar cada folha para o seu uso.
Espero ter contribuindo para diminuir as dúvidas existentes sobre esse tema.
Abraços,
Babalòrìsà José Carlos de Ibualamo
BABÁ JOSÉ CARLOS, PARABENIZO PELA SÁBIA DECISÃO DE TORNAR O CAMDOMBLÉ UMA RELIGIÃO MAIS COMPREENDIDA E ESCLARECIDA PARA SEUS FILHOS! A`SE BABÀ MOTUMBÀ
ResponderExcluirSempre há uma luz, uma sábia palavra por trás da figura do Babá José Carlos. Meu pai, agradeço-lhe por tudo e vejo a sua humildade, acima de tudo, em nos agraciar com um pouco do seu tão vasto conhecimento sobre vários temas ligados à nossa religião, seja de ordem litúrgica, seja de ordem histórica, comportamental. Uma pessoa para quem não tenho palavras para exprimir tamanha admiração!! Do seu filho que muito te estima, Carlos de Oxalá!!!
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ResponderExcluirMo juba Baba!
ResponderExcluirLendo suas postagens no Orkut, sempre dedicadas com muito carinho e apreço, venho em seu blog apreciar seus ensinamentos sempre muito ricos para à sociedade, ainda que existam leigos e estudiosos, nós do asé sabemos o quanto é importante o seu trabalho sacerdotal, as atividades sociais de sua Ilé Asé e todo o seu encanto como pessoa.
Parabéns pelo blog com o desejo de muito asé à toda sua família e ao senhor.